José Costa Leite nasce em 27 de julho de 1927, em Sapé, Paraíba, no seio de uma família de pobres agricultores. Tem uma infância muito difícil, de privações e apertos, sendo obrigado a trabalhar desde os 8 anos de idade, em lavouras de algodão e cana-de-açúcar, para ajudar no sustento da família. Cresce, portanto, sem frequentar a escola.
Mas aprende a ler e escrever por conta própria, de uma forma surpreendente: escutando e decorando os versos rimados e metrificados dos folhetos de cordel, que são declamados pelos vendedores em feiras públicas, e depois comparando o texto memorizado com o dos livrinhos. Ao mesmo tempo, essa literatura vai despertando sua criatividade e imaginação, estimulando-o a esboçar seus primeiros versos.
Aos vinte anos, buscando uma vida melhor, José Costa Leite começa a revender folhetos, entre outras miudezas, em feiras de cidades do interior. Finalmente, a partir de 1949, passa a publicar e vender folhetos de sua própria autoria, conquistando o público com suas histórias de amor, humor e bravura, entre muitos outros temas. A partir da década de 1960, também escreve e publica orações, almanaques e guias astrológicos.
Constrói, assim, uma trajetória que se prolongaria até o final de sua vida e que resultaria na publicação de mais de mil títulos, em centenas de milhares de exemplares, a maioria com o selo de sua folhetaria, “A Voz da Poesia Nordestina”.
Os primeiros folhetos de José Costa Leite saem sem ilustração: pensando que a gráfica se encarregaria dessa parte, o poeta não se preocupou em fornecer as matrizes de xilogravura com as imagens para a capa dos livrinhos. Decide, então, criar suas próprias ilustrações, gravando imagens na madeira, após observar algumas matrizes prontas. Começa, assim, sua carreira como xilógrafo, que o levaria a criar incontáveis xilogravuras de cordel, para si mesmo e para outros poetas e editores.
A partir da década de 1960, com o movimento de valorização e promoção da literatura e da gravura popular, a obra de José Costa Leite ganha uma nova projeção, passando a ser admirada não só pelo público tradicional, mas também pelas instituições culturais e pelo público erudito.
Nesse novo contexto, suas xilogravuras ganham o status de “obra de arte” e novos usos: figuram em exposições no Brasil e no exterior, constituem coleções públicas e privadas, compõem álbuns de arte e se apresentam como estampas independentes, em grande formato, para decoração. Da mesma forma, sua poesia começa a ser veiculada em novos suportes, como discos em vinil e, mais tarde, CDs, com o próprio poeta cantando as histórias de seus folhetos mais famosos, ao modo de cantoria.
Essa diversidade mostra a versatilidade e o talento multifacetado de José Costa Leite, artista polivalente que utiliza diferentes linguagens, em diversos suportes, para expressar sua sensibilidade e criatividade.
Várias iniciativas contribuíram para o reconhecimento da importância de José Costa Leite e de sua obra, das quais é possível destacar:
- Concessão do prêmio “Leandro Gomes de Barros”, pela Universidade Regional do Nordeste, de Campina Grande (PB), pelo conjunto de sua obra;
- Estadia na França, como convidado do Musée du dessin et de l’estampe originale de Gravelines, para participar da inauguração da exposição Du marché au marchand. La gravure populaire brésilienne e realizar oficinas de xilogravura (2005);
- Registro como “Patrimônio Vivo de Pernambuco”, pelo Governo de Pernambuco, o que lhe valeu uma pensão vitalícia (2006);
- Mesa-redonda com Ariano Suassuna, em João Pessoa (PB), no âmbito da homenagem organizada pela Universidade Federal da Paraíba, pelos oitenta anos dos dois paraibanos ilustres (2007);
- Reprodução ampliada (3,5 x 17,50m), em pintura, de xilogravura de José Costa Leite, na fachada do auditório da Estação Cabo Branco, em João Pessoa (PB), projetado por Oscar Niemeyer (2008).
(trechos da obra autobiográfica A Vida da minha Vida, publicado no Recife, pela Editora Coqueiro, em 2012)
Santo Deus Pai Poderoso
Ajudai-me em poesia
Com rima melodiosa
E metrificação sadia
Para eu entrar em cena
E ir traçando na pena
Minha autobiografia.
Em 27 de julho
Do ano de 27
Nasceu José Costa Leite
E logo em pequeno promete
Ser trovador brasileiro
Foi na Fazenda Ribeiro
A até hoje pinta o sete.
De 38 a 47
Eu trabalhei alugado
Na minha pequena idade
Magro, amarelo e cansado
A comida era farinha
E um pedaço de sardinha
Inda mais sem ser assado.
Comecei a trabalhar
Para algum dinheiro ter
Vivia limpando cana
Cumprindo a lei do dever
Todo dia eu trabalhava
Porém o que eu ganhava
Não dava para comer.
Trabalhando na lavoura
Sempre alguns versos eu fazia
Mas sem poder publicar
Dos mesmos me desfazia
Porém, verdadeiramente
Senti que tinha na mente
O extro da poesia.
No mercado de São José
Um certo dia comprei
Uma quantia de cordéis
E numa maleta botei
Pra ver se dava pé
Fui para Usina São José
E a cantar comecei.
Fez uma roda de gente
E o povo observando
Meu braço chega tremia
Quando eu estava cantando
Faltava prática e coragem
Mas ainda levei vantagem
Algum dinheiro apurando.
Eu publiquei dois cordéis
Foram Eduardo e Alzira
E Discussão de Manoel Vicente
Com Costa Leite, na lira
Mas para borrar o mapa
Não teve xilos na capa
Até parece mentira.
Eu pensava que da xilo
A gráfica se encarregava
Na hora que imprimia
A xilogravura botava
Porém eu pensei errado
E fiquei atrapalhado
Porque a xilo faltava.
A um amigo do ramo
Que xilogravuras fazia
E relativo ao cordel
Ele também escrevia
E na feira de Goiana
Na terra pernambucana
Toda semana eu lhe via.
Pedi-lhe uma xilogravura
Pra Valfrido e Dulcinéia
O Príncipe Roldão e Lídia
Rogaciano e Dorotéia
Narciso e Iracema
Pra ilustrar meu poema
E eu aprendi a ideia.
Fiz a ele o pagamento
E as matrizes examinei
Logo aprendi a fazê-las
Desde logo comecei
E aprendi na leitura
A fazer xilogravura
Então nunca mais deixei.
A vida de Costa Leite
É escrever poesia
Em livros ou em cordel
Com rima doce e sadia
Com enredo e oração
E boa metrificação
Que todo mundo aprecia.
Na minha vida fui cassaco
Fui mascate, fui cambista
Fui poeta, camelô
Também fui propagandista
Camponês agricultor
Nos engenhos fui feitor
Sou xilógrafo e cordelista.
Pois a pessoa já nasce
Trazendo a poesia
No dia qu’ele morrer
Ela vai em companhia
Pois a poesia é bela
O vivente nasce com ela
E no juízo ela se cria.
No ano de 2005
Eu viajei para França
Para mostrar meu trabalho
Com muita perseverança
Vinte dias ali passei
Aos franceses ensinei
A fazer xilos sem tardança.
No campo da poesia
Estou tão acostumado
Que tornei-me conhecido
Mesmo sem ter estudado
Na minha luta pesada
Já não encontro mais nada
Difícil de ser rimado.
Digo que homem não morre
Quando deixa de viver
Mas quando deixa de amar
Sem ter amor nem prazer
O homem na vida sofrida
Sem ter um amor na vida
Não é viver, é morrer.
Com Deus no meu pensamento
O meu juízo irradia
Sonhando com a poesia
Totalmente cem por cento
A luz do conhecimento
Leva pra minha morada
Estrada desembaraçada
Inda digo nos versos meus
Tenho muita fé em Deus
E sem Ele não sou nada.